A EJA no Conselho Estadual de Educação do RN: caminhos e descaminhos de uma luta

Em 8 de novembro de 2019, durante o 5o. Encontro Anual do Projeto EJA em Movimento, no final de uma Mesa Redonda sobre ações de garantia do direito à EJA, o representante do Conselho Estadual de Educação (CEE) - um dos convidados para a Mesa - foi perguntado se existia alguém ligado à área de EJA no Conselho, ao que respondeu negativamente, acrescentando que essa questão nunca havia sido posta ao CEE.

Em 2020, o mesmo professor que havia levantado a questão no referido evento, provocou o grupo de WhatsApp do Projeto sobre a necessidade de mobilização no sentido de que fosse garantida uma vaga no CEE para alguém que tivesse vínculos com a modalidade EJA. Como desdobramento, formou-se um grupo para amadurecer essa ideia e pensar formas de mobilização.

Passo seguinte, um dos membros do grupo, em reunião do Fórum Potiguar de EJA (FPEJA), deu o informe de que esta articulação estava sendo gestada e sugeriu-se a participação da coordenação do Fórum nesse processo. Surpreendentemente, a ideia foi ignorada. Nenhuma posição contra. Nem a favor. Só o silêncio como resposta.

Ante essa receptividade pouco animadora, o grupo optou em elaborar um Abaixo-Assinado, com a proposição de que a Secretaria de Estado de Educação e Cultura (SEEC/RN) cedesse “uma vaga de conselheiro ou conselheira no CEE/RN a um nome escolhido pelo coletivo de representação dessa modalidade, com base em reconhecida capacitação técnica no tocante aos princípios norteadores da EJA”.(o teor por completo do Abaixo Assinado pode ser conferido em: https://www.change.org/p/secretaria-de-estado-da-educa%C3%A7%C3%A3o-da-cultura-do-esporte-e-do-lazer-seec-rn-por-um-a-representante-da-eja-no-conselho-estadual-de-educa%C3%A7%C3%A3o-do-rio-grande-do-norte?utm_content=cl_sharecopy_25975693_pt-BR%3A2&recruiter=557270396&utm_source=share_petition&utm_medium=copylink&utm_campaign=share_petition)

Em 22 de novembro, o Abaixo Assinado foi posto em circulação e, mais uma vez, em reunião do FPEJA, foi dado informe, na esperança do seu envolvimento na mobilização e fortalecimento. Como da outra vez, não houve disposição da então coordenadora e outros participantes em discutir o assunto, muito menos, de assinar o documento.

Em fevereiro de 2021, já com 632 assinaturas (inclusive de militantes da EJA de outros estados), os membros do grupo de mobilização do Abaixo Assinado encaminharam um ofício ao gabinete da SEEC/RN, solicitando reunião com o então Secretário com o fim de apresentação do pleito. A reunião aconteceu em 16 de março e na ocasião a equipe da SEEC/RN informou que o aceite da reivindicação estaria condicionado a um processo de reformulação do Regimento do CEE - que estaria em desenvolvimento -, no qual essa questão poderia ser pautada, após o que aquele grupo voltaria a ser contatado.

Tudo isso foi amplamente informado (inclusive ao FPEJA), por meio de material específico e pelo blog do Projeto EJA em Movimento (ver: http://ejaemmovimento.blogspot.com/2021/03/pleito-de-vaga-da-eja-no-conselho.html).

Ao longo de todo o ano de 2021 várias mensagens foram enviadas ao gabinete da SEEC/RN cobrando o cumprimento do que foi acordado, até que em fins de dezembro de 2022, a Secretaria fez contato com um dos membros do grupo de mobilização, e informou que uma vaga no CEE poderia estar garantida para a EJA.

Nesse contato, a SEEC/RN foi orientada a enviar email ao FPEJA comunicando-o da novidade. Com isso, estava-se, mais uma vez, efetivando uma pauta circulante nos Encontros Nacionais e Regionais de EJA e reconhecendo o FPEJA como legítimo espaço para a discussão dessa questão, apesar do seu inacreditável silêncio e imobilismo durante todo o processo.

Até então, o grupo de mobilização havia ensejado uma condução desse processo de forma transparente, pública, seja com o FPEJA, seja com o amplo conjunto de militantes de EJA. Havia a crença de que o FPEJA honraria o conteúdo da proposta apresentada à SEEC - de que a escolha de uma representação da EJA para o CEE ocorresse de forma democrática, participativa, “pela base”. Afinal, esses são os termos mais circulantes nos discursos das atuais lideranças do Fórum. Contudo, o que vimos, a partir do contato da SEEC com o Fórum foi muito estranho, para dizer o mínimo.

No último 11 de janeiro, o presidente do FPEJA postou mensagem no grupo de whatsapp do Fórum, convocando uma reunião (em formato remoto) cujo início se daria apenas duas horas depois (!!!). A pauta se compunha de dois informes e outros sete itens, o último dos quais, denominado “Buscar assento no Fórum Estadual de Educação”.

Na reunião, após a sessão de informes, perguntado se havia se realizado o contato da SEEC/RN para discussão da vaga no CEE. o presidente informou que a questão seria tratada no último ponto de pauta. Lembrado que na convocação da reunião falava-se em buscar assento no “Fórum” - e não no “Conselho” - Estadual de Educação, explicou ter sido um mero equívoco de sua parte. Sobre a demanda trazida pela SEEC/RN, não soube explicar se o FPEJA indicaria uma ou duas vagas e, na hipótese de ser uma, se seria de titular ou suplente.

Uma vez posta a discussão, a maioria dos 16 participantes da reunião resolveu que a escolha do nome aconteceria imediatamente, naquela mesma reunião, sob a justificativa de que a SEEC/RN teria estabelecido o prazo de 48h para envio do nome.

Não adiantou a sugestão que se buscasse negociar com a SEEC um novo prazo a fim de se promover uma mobilização da militância, para que tivéssemos um processo amplo, transparente e participativo. Não adiantou a ponderação que aquela reunião foi convocada de forma açodada, no mesmo dia, duas horas antes de sua realização, sem o devido tempo para mobilização e esclarecimento do coletivo do FPEJA.

Não adiantou apontar o pequeno número de pessoas na reunião e, portanto, sua baixa representatividade. Em resposta, aquela maioria se autoungiu como representantes dos 133 membros do grupo de whatsapp.

A pessoa escolhida, não obstante sua inegável trajetória na EJA, encontra-se formalmente em cargo de comissão na SEEC, portanto, tem a ambígua condição de ser governo e estar representando o FPEJA. A SEEC/RN, ao abrir para que uma vaga do CEE (seja ou não de suplente) venha a ser ocupada por uma pessoa por representar uma modalidade e não porque tenha um “notório saber” reconhecido apenas pelo(a) secretário(a) de plantão, sinalizou para um avanço na forma de pensar as indicações no Conselho, o que, esperamos, se consolide.

Mas, precisamos avançar mais. A vaga não surgiu como resultado de um amplo processo de reforma do CEE, mas em razão de uma pressão exercida sobre a SEEC/RN, por um grupo de militantes da EJA que não esperou a autorização de ninguém para fazer valer uma justa reivindicação. Afinal, ninguém é dono da EJA. O resultado foi um compromisso com o reconhecimento da representatividade da modalidade a partir de uma mobilização democrática.

Também será preciso que impulsos democráticos venham a se entranhar nas práticas do FPEJA, tornando-o mais agregador e expressão da diversidade e multiplicidade de sujeitos que militam na EJA e que, por isso mesmo, podem e devem desenvolver aprendizados mútuos. O processo de escolha conduzido pela coordenação do FPEJA foi lamentável e desnecessário. Perdeu-se uma ótima oportunidade de se buscar capilaridade, visibilidade e legitimidade do próprio Fórum junto aos coletivos de professore(a)s e estudantes que atuam na EJA.

Ainda esperançamos que os próximos desafios não tenham essas máculas, porque precisaremos de todos para fazer a EJA parte orgânica das agendas das políticas educacionais. E com práticas desagregadoras, certamente, isso jamais será conseguido.

Assinam:

Alessandro Augusto de Azevêdo, professor da UFRN (Natal)

Fabíola Maria Dantas, professora das redes públicas municipal e estadual de educação básica (Caicó)

João Maria Freire Alves, professor das redes públicas municipal e estadual de educação básica (São José de Mipibu e Monte Alegre)

Rayane Emanuelle de Oliveira Valentim, professora da rede pública municipal (Natal)

Yara Gomes de Souza Silveira, professora da rede pública estadual de educação básica (Mossoró)

Vírginia Lúcia de Alencar Souza, professora da rede pública estadual de educação básica (Areia Branca)

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